Tem sido recorrente em meu trabalho a pergunta: cerveja artesanal está na moda, né? Por que você acha que isso acontece? Invariavelmente minha resposta tem sido: tomara que não! E mesmo que lhe possa parecer estranho que eu responda isso, explico: muita gente vem trabalhando, há mais de duas décadas no Brasil, para que cerveja seja vista, fabricada e consumida de outra forma. Não seria justo com o trabalho de pioneiros colocar o alcance atual da bebida produzida artesanalmente como moda.
Moda pressupõe algo sazonal, uma febre que vem e que passa, à qual todo mundo se adapta e logo depois substitui por outra. E é isso que queremos para a cerveja artesanal?
Visionários e vanguardistas
Um dos caras mais visionários que conheci no meio cervejeiro chama-se Marcelo Moss. Há mais de 20 anos ele vislumbrou que o Brasil poderia ser um excelente mercado para as cervejas artesanais e, junto a mais dois sócios, criou um modelo de negócios bastante arrojado para aquele momento. Era o final da década de 90 e ele construiu uma fábrica com o objetivo de alugá-la para quem quisesse produzir cerveja. Isso lhe parece hoje bastante familiar, não é? É o princípio utilizado atualmente pelas chamadas cervejarias ciganas. Mas naquela época não decolou. Simplesmente não havia ninguém interessado em fazer cerveja em local alugado. Então os sócios partiram para a produção de cerveja, fundando uma pequena cervejaria chamada Baden Baden, na cidade paulista de Campos do Jordão. Utilizando-se da localidade da fábrica, criaram o bordão de fazer uma cerveja com a mais pura água vinda das montanhas. E não é que a coisa pegou? Tanto assim que a cervejaria foi vendida para a Schincariol, hoje pertencente à Brasil Kirin, deixando os visionários cervejeiros bastante bem de vida.
Toda essa história, que me foi contada pelo próprio Moss, meu colega na primeira turma Doemens no Brasil, me serve para mostrar que não teve acaso na, ainda pequena, parcela de mercado conquistada pela cerveja artesanal. Isso é fruto do trabalho somado de tantos outros pioneiros como Eduardo Bier, Marcelo Carneiro, Herwig Gangl e muitos mais.
Surfistas na onda
É claro que ao ver o mercado se ampliando para as cervejas artesanais muita gente cresce o olho para beliscar uma fatia desse bolo. Afinal, não é o que o povo está gostando de comer? E assim temos visto um sem número de pessoas entrando no mercado com voracidade para abocanhar o bolo inteiro. E não é interesse fazer trabalho de formiga, como muitos vêm fazendo nas últimas duas décadas no país, para ampliar o mercado. A idéia é ganhar dinheiro, muito e rápido. Em conversa com outros profissionais do mercado cervejeiro, que trabalham na área de consultoria, constatei que é cada vez maior o número de pessoas, demitidas ou demissionárias, de diversas áreas, dispostas a investir tudo o que apuraram em anos de trabalho na abertura de uma cervejaria. E o argumento delas: esta é a área que tem dado dinheiro!
Não recrimino, muito menos julgo, quem queira investir recursos e trabalho na área cervejeira. Mas me incomoda ver a atuação de muitos que acreditam poder chegar ao mercado passando por cima do trabalho daqueles que implementaram um mercado que não existia, julgando-os bobos, porque deixaram de ganhar dinheiro fácil. Também não me entra na cabeça as pessoas acreditarem que esse é o mercado que ” está dando dinheiro”.
Consistência e não moda
Por isso é que digo que torço para que cerveja artesanal não esteja na moda. Espero muito que o momento de multiplicação de oportunidades que estamos vivendo seja o fruto consistente do trabalho de todos os que vêm construindo esse mercado, me incluo nessa lista, afinal há 10 anos trabalho a favor da ampliação dele. E mais ainda, espero que esse fruto continue gerando outros e mais frutos, porque ainda somos um segmento pequeno, que pode e deve crescer, mas sem a ganância furiosa de quem só enxerga nele mais uma chance de ganhar dinheiro fácil. Aqui é trabalho, e trabalho bruto!
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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Portal UAI.
Sou consumidor ativo deste segmento há vários anos, e concordo plenamente com a sua colocação Fabiana. Parabéns pela excelente matéria!
Obrigada. Acho que todo mundo vê isso, mas é difícil expressar sem parecer reserva de mercado.
Reconheço o trabalho dos visionários que pavimentaram essa cultura cervejeira aqui no Brasil. No entanto, não vejo problema algum em ver “cervejeiros aventureiros” investindo o seu capital no mercado craft. Não há nenhum demérito em ganhar dinheiro de forma honesta. E o individuo para ser reconhecido nesse negócio tem que produzir algo realmente bom. O público artesanal é exigente. E a taxação do governo é agressiva. Se a cervejaria não for boa, adeus. Um produto de má qualidade não se sustenta. Precisamos agradecer aqueles que estão dispostos a colocar dinheiro nesse mundo. O Brasil não é escola cervejeira, não temos uma personalidade definida. Existe a necessidade de novas experimentações, aumento da produção, eventos, divulgações, etc. Tudo isso requer dinheiro.
Eu não tenho medo das palavras moda/tendência. A escola americana utiliza muito a palavra trend como um chamariz. E tenho certeza que os americanos fazem desse termo algum muito bom. E eles trabalham com uma tendência [intenção] de forma permanente: experimentação.
Hoje eu penso assim. Obrigado pelo post.
Parabéns pelo artigo. Apesar de ser de Portugal, concordo e sou da mesma opinião. Não acho que seja uma moda no sentido em que os apreciadores vão deixar de gostar de cerveja artesanal, mas é uma moda no sentido em que muitos começam a produzir sem a experiência ou conhecimentos desejáveis e o mercado poderá ficar inundado de cerveja de qualidade duvidosa. Para um consumidor que não conhece o mundo da cerveja artesanal, uma primeira má experiência pode ser o suficiente para decidir que não gosta de cerveja artesanal, para achar que é toda igual, e que ainda por cima é mais cara. Infelizmente isto é muito frequente.
Ainda bem que a cerveja artesanal está na moda, mas é desejável que a qualidade das cervejas seja elevada. Como a qualidade não é uma variável que podemos controlar de fora, resta tentar educar o consumidor sobre este mundo. Blogues como o seu são um bom contributo para isso 🙂
Não conhecia o seu blogue, mas vou estar atento. O meu junta outro alimento à cerveja que não o pão — chama-se “Cerveja e Tremoço” 🙂
Que legal. Ficarei atenta ao seu blog também. Experiências que se somam!
Acho que não se tornará moda, mesmo porque estamos começando a pensar fora da caixinha e descobrindo o verdadeiro sabor das cervejas que ficou tantos anos nas mãos dos grande manipuladores do mercado.Acredito que se formará um grupo seleto de consumidor de cervejas e que manterá este mercado,afinal de contas porque tenho que ficar preso às “outras”.O mais importante é não se deixar levar pelas pressões e continuar a fazer ótimas cervejas como vem sendo feita e nos permita saborear novas cervejas e fugindo do comercial.
Geraldo Pereira Pinto
Reconheço o trabalho dos visionários que pavimentaram essa cultura cervejeira aqui no Brasil. No entanto, não vejo problema algum em ver “cervejeiros aventureiros” investindo o seu capital no mercado craft. Não há nenhum demérito em ganhar dinheiro de forma honesta. E o individuo para ser reconhecido nesse negócio tem que produzir algo realmente bom. O público artesanal é exigente. E a taxação do governo é agressiva. Se a cervejaria não for boa, adeus. Um produto de má qualidade não se sustenta. Precisamos agradecer aqueles que estão dispostos a colocar dinheiro nesse mundo. O Brasil não é escola cervejeira, não temos uma personalidade definida. Existe a necessidade de novas experimentações, aumento da produção, eventos, divulgações, etc. Tudo isso requer dinheiro.
Eu não tenho medo das palavras moda/tendência. A escola americana utiliza muito a palavra trend como um chamariz. E tenho certeza que os americanos fazem desse termo algum muito bom. E eles trabalham com uma tendência [intenção] de forma permanente: experimentação.
Hoje eu penso assim. Obrigado pelo post.
Acho que não se tornará moda, mesmo porque estamos começando a pensar fora da caixinha e descobrindo o verdadeiro sabor das cervejas que ficou tantos anos nas mãos dos grande manipuladores do mercado.Acredito que se formará um grupo seleto de consumidor de cervejas e que manterá este mercado,afinal de contas porque tenho que ficar preso às “outras”.O mais importante é não se deixar levar pelas pressões e continuar a fazer ótimas cervejas como vem sendo feita e nos permita saborear novas cervejas e fugindo do comercial.
Geraldo Pereira Pinto
Sou consumidor ativo deste segmento há vários anos, e concordo plenamente com a sua colocação Fabiana. Parabéns pela excelente matéria!
Obrigada. Acho que todo mundo vê isso, mas é difícil expressar sem parecer reserva de mercado.
Parabéns pelo artigo. Apesar de ser de Portugal, concordo e sou da mesma opinião. Não acho que seja uma moda no sentido em que os apreciadores vão deixar de gostar de cerveja artesanal, mas é uma moda no sentido em que muitos começam a produzir sem a experiência ou conhecimentos desejáveis e o mercado poderá ficar inundado de cerveja de qualidade duvidosa. Para um consumidor que não conhece o mundo da cerveja artesanal, uma primeira má experiência pode ser o suficiente para decidir que não gosta de cerveja artesanal, para achar que é toda igual, e que ainda por cima é mais cara. Infelizmente isto é muito frequente.
Ainda bem que a cerveja artesanal está na moda, mas é desejável que a qualidade das cervejas seja elevada. Como a qualidade não é uma variável que podemos controlar de fora, resta tentar educar o consumidor sobre este mundo. Blogues como o seu são um bom contributo para isso 🙂
Não conhecia o seu blogue, mas vou estar atento. O meu junta outro alimento à cerveja que não o pão — chama-se “Cerveja e Tremoço” 🙂
Que legal. Ficarei atenta ao seu blog também. Experiências que se somam!